Crianças que deveriam estar na escola são recrutadas pelo crime organizado, afirma Styvenson

Senador Styvenson Valentim (Podemos-RN) critica ação do Governo do RN - Foto: José Aldenir P

A onda de ataques que amedronta a população do Rio Grande do Norte há exatos 12 dias tem com causas principais a falta de estrutura das forças de segurança, a carência de pessoal nas polícias Civil e Militar e sobretudo os problemas crônicos do sistema público de educação. A avaliação é do senador Styvenson Valentim (Podemos), que afirma que a falta de um sistema educacional de qualidade tem feito com que crianças sejam recrutadas para o crime organizado.

A análise foi feita pelo parlamentar em entrevista concedida nesta sexta-feira 24 à 96 FM. Ele comenta que o Rio Grande do Norte tem um índice “altíssimo”
de evasão escolar, devido à falta de uma estrutura mínima para as crianças e adolescentes que são atendidas pelo sistema público de ensino.

“De onde vem essa criminalidade todinha? Essa criminalidade pega um ônibus e vem de Pernambuco, da Paraíba e vem para cá? Não, essa criminalidade é recrutada aqui. E quem são esses recrutáveis? São aquelas crianças que normalmente deveriam estar na escola e não estão, porque a evasão é altíssima no Rio Grande do Norte”, analisou o senador durante a entrevista.

A evasão escolar também foi tema de um pronunciamento de Styvenson na última quinta-feira 23 no plenário do Senado. O senador citou um estudo realizado pela Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), em agosto de 2022, que revelou que 2 milhões de brasileiros entre 11 e 19 anos de idade, que ainda não haviam terminado a educação básica, deixaram as escolas. Para ele, a pesquisa mostra que a exclusão escolar afeta principalmente os mais vulneráveis.

Na tribuna do Senado, Styvenson disse ainda que a segunda etapa do Censo Escolar da Educação Básica, divulgada em 2021, revelou que o Rio Grande
do Norte está em segundo lugar no ranking nacional de abandono escolar. Os números apontam que a cada 100 estudantes potiguares, apenas 59 completam o ensino médio aos 19 anos e somente 85,5% concluem o ensino fundamental aos 16 anos. Styvenson também afirmou que entre 2020 e 2021 o número de matrículas em Natal caiu 1,7% no ensino fundamental e 3,8% na educação infantil. “O que existe é um ciclo vicioso que não foi corrigido, que se alimenta da ausência e das falhas do Estado, desde a educação, desde o lazer, desde o esporte, desde colocar uma estrutura mínima nas periferias, em locais onde há esses viveiros”, pontuou Styvenson durante a entrevista nesta sexta.

Ele citou como case de sucesso em investimento na educação o exemplo da Escola Estadual Maria Ilka de Moura, no Bairro Bom Pastor. Desde 2017 o senador ajuda nas atividades da unidade, que hoje funciona sob o modelo cívico-militar e ostenta uma nota 4,8 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). A média no Rio Grande do Norte é 2,8, sendo a pior do Brasil. Styvenson lembra que a escola do Bom Pastor estava tomada por uma facção criminosa e seria fechada, mas após uma reestruturação a unidade foi reerguida e hoje é referência no Estado “A mancha criminal era altíssima. Favela do Japão, todo mundo ouvia pelo nível de violência, decapitação. Hoje em dia reduziu, sabe por quê? Porque as crianças estão na escola”, comemora.

O senador afirma ainda que conseguiu destinar R$ 6 milhões para que a unidade possa ampliar sua capacidade para mil alunos. O recurso está disponível
no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) até 31 de dezembro desse ano, mas o processo para a reforma encontra-se parado na Procuradoria Geral do Estado (PGE).

Fátima hesitou em pedir apoio da Força Nacional, diz senador

Ainda durante a entrevista, o senador Styvenson Valentim revelou que a governadora Fátima Bezerra chegou a hesitar, em um primeiro momento, em pedir ao
Ministério da Justiça o apoio da Força Nacional. Logo no início da crise, quando começou a série de ataques no Estado, a governadora cumpria agenda em Brasília. Diante dos fatos, ela participou de uma reunião no Ministério da Justiça com alguns parlamentares e o secretário de segurança do RN, Coronel Francisco Araújo, que participou por videoconferência “A governadora demorou a tomar providências. No primeiro dia ainda ficou cogitando na reunião de bancada, passou a bola para o Coronel Araújo e disse: dê opinião técnica. Precisa ou não da Força Nacional?”, revelou o Styvenson.

De acordo com Valentim, durante a reunião a governadora foi questionada se o efetivo da PM seria suficiente para conter a crise. A pergunta, segundo ele, não
foi respondida. “Ela estava ali demorando a pedir ajuda da Força Nacional. Se ela disser que é mentira… olha, olha, a gente tem como provar isso aí”, disse o senador. “Aí passa a palavra para o coronel Araújo para decisão técnica. Aí o coronel Araújo devolve a decisão como sendo decisão política. No mínimo isso aí é um bate-cabeça”, acrescentou, afirmando que toda a reunião foi filmada e ele tem como provar caso seja desmentido.

GLO. Em meio à onda de violência promovida por facções criminosas no Rio Grande do Norte, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a pedido de Styvenson, chegou a solicitar que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) autorizasse uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) no Rio Grande do Norte, o que não foi atendido pelo Governo Federal. Styvenson relatou que seu pedido ao presidente do Senado foi feito em um contexto em que a população do RN se encontrava amedrontada e na espera por um reforço das forças de segurança. “Você tem um segurança para proteger o seu comércio, num momento de terror como esse, se eu ofereço dez seguranças a mais você vai recusar? Então qual é o problema de você ter mais militares na rua”, questiona o senador.

O parlamentar, que atuou boa parte da sua vida como policial militar, lembra que a PM do RN dispõe atualmente de um efetivo insuficiente para garantir uma segurança de qualidade para os 167 municípios potiguares. Diante disso, a GLO ajudaria a conter a onda de ataques de forma mais célere. Valentim rebateu o argumento de que as Forças Armadas só podem ser acionadas para reforçar a segurança pública em situações extremas, razão pela qual não teria sido autorizada a operação de GLO no RN. “Será que explodir ponte, jogar granada, queimar patrimônio público e privado, será que você ficar aterrorizado isso não é extremo não?”, interrogou.

TERRORISMO. O senador explicou um projeto de sua autoria (PL 3.283/2021) que altera as penas e tipifica como atos terroristas as condutas praticadas em nome ou em favor de grupos criminosos organizados, como as ações que estão sendo registradas no Rio Grande do Norte desde o último dia 14 de março, com ataques a ônibus, estabelecimentos comerciais, prédios públicos e bens privados. O projeto está na Comissão de Segurança Pública e teve pedido de vista solicitado pelo PT. Segundo o parlamentar, a pedido do Partido dos Trabalhadores, haverá uma supressão no projeto, para que a lei não dê margem a interpretações que possam associar manifestações de cunho político ao objeto discutido pela legislação. “Para poder passar precisa haver concessões”, disse o senador, esclarecendo que o projeto de sua autoria trata de organizações criminosas. “Estou falando de facções, de pessoas que se organizam para cometer crimes como a gente está vendo no Rio Grande do Norte e isso foi bem consensual entre os senadores”.

MUDANÇA DE PARTIDO. Ainda com a bancada do Podemos rachada em relação a uma possível adesão ao governo Lula, o senador potiguar avalia que na prática esse apoio já aconteceu, razão pela qual ele está procurando um novo partido para se filiar, uma vez que não deseja dar sustentação ao governo petista no Congresso.

“Eu estou olhando um partido para poder migrar. Não sei ainda se vou ficar no Podemos. Como eu mudei a minha estratégia política e disse que vou usar as armas do mesmo calibre que os outros usam, já que eles não têm coragem de jogar o meu jogo, que é um jogo limpo, um jogo sem usar dinheiro público… tempo de TV, fundo eleitoral, capilaridade, partido grande, coligações, quer dizer, vou atirar de .50 agora”, adianta o senador.

MORO x LULA. Styvenson também criticou a declaração do presidente Lula dada após a Polícia Federal ter descoberto e desarticulado um plano para matar o senador Sergio Moro e sua família. Lula falou que o suposto plano para tirar a vida do ex-juiz da Lava Jato é “mais uma armação”. “Armação de quem? Porque
o cara planeja, gasta dinheiro – porque tinha um cofre cheio de dinheiro – aluga casa, faz tudo para tirar a vida do cara e não queria só tirar a vida, eles queriam expor como ato terrorista”, disse o senador. Valentim classificou a fala de Lula como uma “diarreia mental” e destacou que todo o Senado Federal está solidário a Moro.

Fonte/Agora RN